O vento soprava-lhes segredos e trazia notícias de outros lugares… Falava das cidades tão diferentes dos pinhais e também dos homens, estranhas criaturas que lá viviam. O renque de pequenos pinheiros, ouvia com a atenção e curiosidade próprias da infância. Lá do alto, os seus progenitores, sorriam meigamente e abanavam as folhagens num terno sussurro.
Entre os pinheirinhos, havia um mais atrevido e curioso. Estava sempre à frente nas perguntas e era incansável a fazê-las. Quando o vento partia, suspirava com pena, mas passava a ser ele o centro das atenções. Sonhava alto, divagava e era tão imaginativo que a todos encantava.
_ Como desejo crescer para ver mais longe! Espreitar o mundo lá de cima. E aquela história da árvore de Natal! Levam uma, ainda criança e rodeiam-na de cor e luz. Deve ser tão bom! Gostava de ser uma dessas árvores de Natal.
_ Como podes dizer isso? Respondeu o companheiro do lado.
_Se alguém resolve vir aqui buscar algum de nós, será para sempre, não mais voltará!
Pensativo, o nosso piheirinho respondeu:
_ Acho que mesmo assim valeria a pena. Viver menos, mas tão intensamente, tão rodeado de glória e atenção. Além de que seria um previlégio ver o mundo de perto. Saber como ele é. Não me importaria!
Ouviu-se uma gargalhada terrível que permaneceu alongando-se nos espaços do pinhal e se prolongou para além dele. Os tenros pinheiros, tremeram de medo e calaram-se de imediato. Aquele som, sabiam muito bem, ser o riso do génio das florestas e pelo tom, não augurava nada de bom.
A noite veio fria como competia a Dezembro. De manhã, as pequenas agulhas dos nossos amiguinhos estavam cobertas por uma camada transparente e fria onde se reflectia a luz tímida do sol. A manhã decorria tediosa entre nuvens de vapor evolando-se da terra e formando pequenas brumas e nevoeiros, tornando vultos imprecisos os conhecidos vizinhos. Toda a floresta denotava a vida habitual. As árvores adultas há muito despertas pela luz, conversavam amenamente. A passarada chilreava num orquestrar desencontrado de trinidos e os outros animais pssavam devagar ou correndo para as suas diárias fainas de sobrevivência.
De repente, tudo parou. Lá ao fundo, começou a surgir um novo som. Era um roncar parecido a um trovão, mas não o era. Era sim um objecto andante de dentro do qual saíram algumas das tais criaturas humanas. Já não era a primeira vez que alí iam e o vento contava histórias dos seus costumes pelo que todos as conheciam e desconfiavam da pacificidade dos motivos porque ali estavam.Vozes encheram a floresta. Árvores pequenas eram abanadas e observadas com minúcia. Uma delas, precisamente o nosso conhecido pinheirinho curioso, tremeu ao contacto daquelas mãos desconhecidas e ásperas no pegar. Depois, sentiu as dores de quem era agredido até ser separado da terra. Arrancado pela raíz pouco profunda e forte para o segurar. Sem tempo para despedidas, viu-se dentro do tal objecto andante, a caminho, pensava ele, da tal cidade tão falada pelo vento.
Assim foi. Chegado á cidade ficou á espera num vasto espaço até que foi levado para um átrio onde o plantaram num grande vaso, o cobriram de laços, luzes e bolas coloridas.
De início, sentiu-se receoso e expectante, sem perceber muito bem o que estava acontecendo mas quando todas as luzes se acenderam e reparou melhor no mundo à sua volta e no reflexo que o espelho lhe transmitia de volta, ficou maravilhado. Era um grande espaço onde transitavam os tais humanos de todos os tamanhos e vestidos de variadas cores.Sempre atento, foi aprendendo e fixou todas as novidades: Pessoas, assim chamavam aos humanos, passavam de um lado para oo outro, transportando embrulhos coloridos. Alguns, mais pequeninos, as tais crianças que o vento nomeava, paravam extasiadas a olhá-lo. Sentado num faustoso assento, uma dessas pessoas mais crescidas, vestida de vermelho e branco. Chamavam-lhe Pai Natal e as criancinhas deliciavam-se à sua volta. Uma palavra muito dita era Natal e ele percebeu ainda que tudo aquilo tinha a ver com essa festa assim chamada.Um dia havia de perguntar mais ao vento sobre tudo aquilo. O vento não passava por ali e o nosso amigo sentia-se muito solitário mas ao mesmo tempo muito vaidoso da sua figura chamativa e feliz pela experiência que estava a viver. Foram dias inesquecíveis mas que terminaram drasticamente. Um dia, as luzes de repente apagaram-se e o escuro dominou. O escuro, o vazio e a tristeza.
No dia seguinte, mal clareou, apareceram muitas pessoas que num ápice desfizeram todo o cenário envolvente e também o despojaram de todos os enfeites, arrancaram abruptamente do vaso e o deitaram numa lixeira junto de restos festivos que variavam de comida a papéis, laços e fitas, tudo amarrotado, tal como ele longe da glória de há dias. Também havia outros pinheirinhos por ali abandonados. Quis falar-lhes mas a tristeza dominante era grande e a ninguém apetecia conversar.
O vento, única figura conhecida, passava por ali.
_ Olá! (Disse o nosso pinheirinho). Que saudades tenho de casa! Levas-me para lá?
_Meu amiguinho! Bem gostaria mas não posso! Não conseguiria cumprir tal tarefa! Só posso dar-te notícias e dizer das muitas saudades que todos têm de ti e da falta que fazes naquele renque de pequeninos. As tuas perguntas originavam conversas tão interessantes! Nuncca mais tal aconteceu.
E o vento lá partia de novo, para as suas constantes andanças, deixando o pinheirinho solitário, aguardando o ignorado seguimento da sua vida. Com o passar dos dias, começou a sentir-se cada vez mais fraco. Inutilmente dava voltas à sua fértil imaginação, para encontrar uma saída. Lembrou-se do génio da floresta e daquela gargalhada sinistra, no dia em que sem saber o que dizia, desejou aquele destino.
_ Génio! Tem pena de mim! Ajuda-me! Estou arrependido do que disse naquele dia! Como gostava de estar na floresta junto dos meus pais e amigos! Por favor ajuda-me! Não me deixes morrer, aqui abandonado!
Mal tinha acabado de expressar a sua sentida oração, ouviu vozes e sentiu uma criança a agarrá-lo dizendo:
_ Este, pai! Levamos este!
_ Está bem! É bonito e tem um bom tamanho! Vai ficar bem no jardim da nossa casa!
A criança, um menino, dava saltos de contente.
_Oh pai! Que bom! Vai ser o meu amiguinho.
E assim foi. A sua vida continuou calma e feliz entre flores e arbustos bem tratados como também ele passou a ser. À frente desdobrava-se uma rua onde via o vai e vem de pessoas e carros e onde foi ao longo da vida aprendendo sempre mais e mais, pois nunca perdeu aquele olhar curioso da infância.
Por vezes lembrava com saudade os seus pais e amigos mas ganhara novos amigos e o menino visitava-o todos os dias, sentava-se à sua sombra e contava-lhe tudo o que ia acontecendo.
No ano seguinte, na sua frente, foi plantada uma outra árvorezinha da sua espécie a qual lhe sorriu gaiteira e lhe provocou uma forte batida no coração. Uma nova era começava…
18 de Dezembro de 2010